Em 1985, Margareth Atwood publicou O Conto da Aia, ficção especulativa que discorre acerca das experiências de uma mulher em um futuro próximo, sob o regime de uma teonomia totalitária fundamentalista cristã que, ao derrubar o governo dos Estados Unidos, destitui as mulheres de todos os seus direitos humanos, forçando-as à servidão laboral e sexual.

Na escrita de sua obra, Atwood realizou uma extensa pesquisa bibliográfica. Todas as práticas de servidão, controle, negação de direitos, tortura e violências às quais as mulheres são submetidas na história já foram, ou ainda são, praticadas e legalmente permitidas em algum lugar do mundo. Muito atenta aos movimentos políticos de sua época, ela, infelizmente, previu o futuro.
Na década de 1990, fortaleceu-se e se difundiu pelo mundo árabe o movimento fundamentalista islâmico do Talibã. Em 1994, o Talibã passou a governar, efetivamente, o Afeganistão, iniciando um reinado de terror. Assim como em O Conto da Aia, mulheres foram destituídas do direito a estudar, trabalhar, ou mesmo sair de casa desacompanhada, forçadas à violência e medo, perdendo até o mesmo o direito a um nome próprio.
É essa a realidade descrita em A Cidade do Sol. Khaled Hosseini nos mostra uma verdade muito ignorada no ocidente: que, antes da tomada de poder do Talibã, o Afeganistão vivia o seu processo de luta pela igualdade de gênero. Assim como observado até hoje no Brasil, esse processo era desigual, e a menina que se preparava para ir para a universidade morava lado a lado à mulher em situação de violência doméstica.
O Talibã, entretanto, tornou qualquer processo de luta pela igualdade impossível. As duas obras nos mostram outra realidade pouco discutida: que, em sociedades onde as mulheres não têm liberdade, a maioria dos homens também não a têm. Apenas um grupo seleto de homens, pertencentes à etnia certa ou nos lugares de poder corretos, possui liberdade. Os demais, também estão sujeitos à violência.
A mensagem que ambas as obras deixam, no entanto, é que as situações de desumanização impostas sobre as mulheres só podem ser superadas através da união entre mulheres. Apoio, cuidado e sororidade possibilitam as forças necessárias para continuar lutando por um mundo melhor para todas, todos, todes.
“Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá de se manter vigilante durante toda a sua vida.” Simone de Beauvoir
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Dra. Letícia de Mélo Sousa
Psicóloga (CRP/13 – 6856). Doutora e Mestra em Psicologia Social pela UFPB. Professora Adjunta na UNIFACISA
Pesquisadora nas áreas de gênero e sexualidade, violência contra a mulher e violência online.